quinta-feira, 7 de julho de 2011

O Que Cruls Encontrou no DF

        Quando Luiz Cruls e sua equipe chegaram ao Planalto Central brasileiro, os chapadões ali existentes já estavam repletos de trilhas, caminhos e comunidades instaladas. Além dos índios nativos, outros humanos adentraram rumo Oeste desde a chegada dos portugueses, mas em especial a partir de fins do Século 17.
        Há evidências de que o ente humano se infiltrou no cenário do Brasil Central há perto de 12 mil anos. São esqueletos, inscrições rupestres, utensílios e ferramentas localizadas em sítios arqueológicos. Pesquisadores como Altair Sales Barbosa identificam as fases com os nomes dos locais onde foram feitas as descobertas.
 Segundo o historiador Paulo Bertran, essas fases são a Paranaíba, de caçadores que viveram em tempo mais frio e úmido do que o atual; a Serranópolis, que durou até os anos 1000 de nossa era; e a Jataí, do último milênio, em que os indígenas produziam utensílios variados, objetos de cerâmica e já se alimentavam de produtos agrícolas.
O Tratado de Tordesilhas, entre Portugal e Espanha, foi assinado em 1494. Seis anos, portanto, antes do Brasil ser encontrado. Mas o texto dividia o mundo para os dois países e valia para áreas “já descobertas ou a descobrir”, de modo que a Portugal caberiam terras a Leste da linha fixada e as a Oeste seriam da Espanha.
Quando Cabral ancorou na costa brasileira, sua equipe não sabia direito onde estava e tinha muito menos idéia da dimensão do território em que acabava de chegar. A linha de Tordesilhas cortava o Brasil de hoje mais ou menos ao meio, com um traço em linha reta de Norte a Sul.
Por coincidência, ao cruzar o Centro-Oeste, essa linha passava 72 quilômetros a Oeste de onde está agora a Praça dos Três Poderes, em Brasília, construída 460 anos depois. O atual Distrito Federal ficaria no Brasil de todo modo, pois.
 A partir de 1530, portanto logo após o descobrimento, os portugueses foram tomando conta do seu pedaço e um bom bocado a mais. Na captura de índios e busca de ouro, prata e diamantes, bandeiras e entradas não tinham limites. O tão cobiçado e sonhado Eldorado poderia muito bem estar por ali.
Diante de escassez de força de trabalho, entre 1600 e 1630, bandeirantes paulistas desceram pesadamente para o Sul, para capturar índios guaranis. Algumas décadas depois, porém, suas atenções se voltaram para o Centro-Oeste, onde havia índios da etnia macro-gê, com língua e cultura diferentes dos habitantes do litoral.
A ordem geral era buscar índio e ouro no “além Tietê”, atingindo o vale do Paraná/Paranaíba e, depois, os do São Francisco, Tocantins e Araguaia. A primeira bandeira a penetrar no território goiano foi a de Domingos Luís Grou, um português que, desde antes do início de sua viagem, era casado com uma índia. Em 1593, ele e seu grupo foram mortos no sertão goiano por índios hostis.

        Foi só no início do Século 18, porém, que o movimento para Oeste ganhou vulto. Em 1722, foi organizada a primeira bandeira de Bartolomeu Bueno da Silva Filho, conhecido como Anhanguera II, cuja função primordial era a de expandir as fronteiras Oeste do Brasil.
        Ele enfrentou muita dificuldade para chegar à região onde hoje está Brasília, o que ocorreu, em verdade, por erro e teimosia do bandeirante. Do Paranaíba sua tropa deveria seguir a Oeste, mas ele determinou o rumo Norte, indo bater nos chapadões do Planalto Central. E por ali perambulou por quase três anos.
        Foi no vale do rio Paranã, pouco ao Norte do DF, que o bandeirante topou com índios Crixás, que eram acossados por caiapós. Inicialmente, houve conflito, mas Anhanguera II não permitiu a morte de nenhum índio. Era diferente de seu pai (Anhanguera), famoso pelo morticínio que praticou em Minas Gerais e Bahia.
Na segunda expedição, em 1726, Anhanguera II fundou Vila Bela da Santíssima Trindade, no Noroeste do Mato Grosso, e Vila Boa (Cidade de Goiás), em Goiás. E descobriu muito ouro. Suas duas bandeiras atraíram para a região milhares de brancos e escravos negros.
Dez anos depois do surgimento da primeira povoação, as minas de Vila Boa, por exemplo, tinham mais de 10 mil escravos em frenética atividade. Dessa miscigenação surgiu o cerratense, chamado de “população tradicional” pelos estudiosos. Nessa época, nasceram outros centros auríferos, como Pirenópolis, Corumbá e Luziânia.
A necessidade de comunicação com Salvador, então capital do País, fez surgir a Estrada Real, que cortava a área do atual DF. Este era o caminho oficial, onde, em pontos estratégicos, ficavam as contendas (postos fiscais), que faziam a coleta de impostos. Na altura de Planaltina havia uma dessas barreiras.
Mas havia trilhas abertas por contrabandistas, que cortavam serras, vales e chapadas da região, sobre as quais a Corte portuguesa e as autoridades locais nem tinham controle.
A pesquisadora Leonora Barbo crê, com base em relatos de viajantes, que Sobradinho pode ter surgido antes de Planaltina, como paragem. Assim como há relatos de um “cocal” no local onde está Cocalzinho, ao sopé da Serra dos Pirineus.
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JAIME SAUTCHUK - Publicado Em Edição Especial da Revista do Instituto Histórico, em homenagem à Missão Cruls, este mês


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